Denilson Mariano da Silva
“O Sol nascente nos visitará e guiará os nossos passos no caminho da paz” (Lc 1,78-79). Guiados por esse lema, um grupo de cristãos leigos e leigas, de várias cidades mineiras, sobretudo da região da Zona da Mata, da região Metropolitana de Belo Horizonte e do Vale do Jequitinhonha, realizou o 25º Encontro de Políticos Cristãos.
O encontro foi realizado na Casa do MOBON, em Dom Cavati-MG, nos dias 1,2 e 3 de abril de 2022 e contou com a participação de 286 pessoas de mais de 60 cidades diferentes.
Símbolos que nos fazem ver mai longe
A abertura do encontro foi marcada por um clima de fé e pelo cultivo da espiritualidade. Todos foram convidados a voltar sua atenção para dois símbolos que nortearam todo o encontro. João Resende, do Movimento da Boa Nova, destacou primeiramente a planta do cerrado, em seu conjunto, verdadeira “floresta de cabeça para baixo”. Plantas de cascas grossas para resistirem às queimadas e raízes profundas que tocam o lençol freático e permitem dar frutos em abundância apesar do clima seco. Símbolo do cristão que cultiva uma sadia espiritualidade, que finca suas raízes na Palavra de Deus e na prática de Jesus, tornando-se resistente às adversidades e dando-lhe condições para produzir frutos de justiça, solidariedade e paz.
Outro símbolo por ele destacado foi o girassol. Planta que se volta sempre para o sol, ali simbolizando a presença do Senhor, o grande sol nascente que vem nos visitar. Expressão também da necessidade constante de cada cristão não afastar-se do Senhor, mas n’Ele sempre buscar a luz e direção para a missão. Em dias, sombrios, quando o sol não aparece, os girassóis voltam-se um para o outro, sinal da necessidade de manter-se unido em comunidade, de reforçar a fraternidade nos momentos sombrios da vida e da história. Fez-se uma aproximação dos dois símbolos por meio de uma muda de Jamelão, uma planta do cerrado, com várias raízes expostas, que foi colocada no salão de encontro e nela foi afixado o nome de cada um dos onze pólos presentes no encontro. Os nomes foram escritos em cartazes em forma de girassol.
Seguindo a dinâmica Ver – Julgar – Agir, a sexta feira foi dedicada a tratar dos perigos das fake news nas eleições de 2022. Para isso contou com assessoria do jornalista Otávio Antunes, com ampla experiência em Marketing político. Depois de uma breve contextualização do fenômeno das fake news e do seu eventual crescimento em nossos dias, recordou que o universo digital é parte de nossa vida e que temos de nos preparar para a “batalha tecnológica” e para isso será indispensável a participação ativa e efetiva da juventude que tem maior capacidade de interação nas redes sociais. Salientou que devemos reproduzir nas redes sociais o que fazemos de melhor na vida real, Na convicção de que “mudando uma vida, mudamos o mundo”. Devemos ser o que somos, mostrar a nossa prática de buscar a justiça, a solidariedade, o bem comum e a paz. Além disso, apontou para o “disque denúncia de fake news” que faz um serviço de monitoramento e pelo qual é possível denunciar fake news bem como pedir a vacina para ela. Mas para ser mais efetiva essa iniciativa precisa ser reproduzida no nível estadual.
Discernir por onde ir
O sábado foi direcionado para o discernimento da realidade em três momentos distintos: um olhar sobre o nosso tempo como uma época não apenas de mudança, mas de profunda transformação; a importância do trabalho base do MOBON; um novo olhar sobre a política.
Márcio Pochmann, economista e professor da UNICAMP, por meio de um breve percurso histórico desde a década de 1880, destacou que não somos um país de cultura democrática. Daí a fragilidade de nossa democracia e a dificuldade de imprimir mudanças a partir de baixo, a partir dos empobrecidos, além disso, com as transformações desta “era digital”, as ferramentas que serviam para intervir ou mudar a sociedade perdem sua eficácia. As incertezas, a falta de expectativas, o momento sombrio, levam a uma espécie de “cancelamento do futuro” e a uma “ditadura do presente”. Por outro lado, o momento histórico, parece sinalizar uma “ruptura de época”, uma oportunidade para mudar a história. Mas não se muda a sociedade por meio das eleições, apenas, é preciso ampliar a correção de forças. Vivemos uma “década de transição”, estão surgindo novos sujeitos sociais e isso pressupõe novas formas de organização. Os rumos de nossa história dependerão da nossa capacidade de captar o novo que surge e de criar novas de organização a partir de baixo.
Na sequência, Denilson Mariano, do MOBON, enfatizou a importância do trabalho de base e da formação de lideranças apresentando os cristãos leigos e leigas como fermento, sal e luz, na igreja e na sociedade. O símbolo é expressão de uma realidade maior, algo que não se esgota e permite sempre novas compreensões. Assim como uma pequena porção de fermento é capaz de levedar a massa, como uma pitada de sal dá sabor e uma mecha de luz permite vencer a escuridão, há uma força escondida de Deus que move o povo de nossas comunidades. Despertados pela caminhada de fé, alimentados pela Palavra de Deus e pela eucaristia, muitos vêm abraçando as ferramentas sociais e têm se tornado instrumentos de transformação social favorecendo a promoção da justiça e do bem comum. Salientou por fim a necessidade de ter os pés firmes no chão, na realidade vivida, os olhos no horizonte, para sabermos para onde ir e sujar as mãos, ousando ser criativos, apostando em novas iniciativas que preservem a dignidade da vida humana e contribuam para uma ecologia integral,
Um novo olhar sobre a política foi trazido por meio da juventude em uma mesa de partilha e debates, coordenada por Pâmela Roberta, secretária da comissão de direitos humanos da OAB/MG. Ana Rosa, escrivã, partilhou a criação de um novo modo de denúncia da violência doméstica por meio do WhatsApp com o projeto “Chame a Frida”; MC Capacete partilhou sua trajetória como primeiro vereador negro e jovem de Guaranésia-MG, vencendo preconceitos e superando o racismo. Miguel Ângelo, advogado, partilhou de sua trajetória de militância em meio às juventudes e o anseio de avançar em seu trabalho de mobilização e da articulação dessa força viva, mas ainda desarticulada. O futuro da sociedade passa por uma aposta nos jovens, com novos ideais, que ousando também assumindo cargos públicos possibilitem uma nova política, verdadeiramente voltada para o bem comum e a justiça social.
Um momento de deserto foi propiciado na celebração de encerramento do dia. Conduzidos por João Resende, do MOBON, os participantes foram convidados a um exame de consciência revendo os passos dados na caminhada eclesial e no engajamento social à luz do texto bíblico de João 15,1-8, a videira e os ramos. Sem estamos unidos a Jesus e a seu projeto de vida, não tem como produzirmos frutos e ainda precisamos identificar o que precisa ser podado, melhorado, para que possamos produzir ainda mais quer no terreno religioso de nossas comunidades eclesiais, quer no terreno social onde estamos engajados: “Aquele que permanece em mim, e eu nele, esse produz muito fruto”.
Outros passos para a caminhada
O agir, reservado para a manhã do domingo, procurou fazer um síntese à luz do lema escolhido: “O sol nascente nos visitará”. Iluminados pelo texto de Is 65, 17-25, anúncio de um “novo céu e uma nova terra”, algumas tarefas foram definidas como novos passos a serem dados na caminhada. Guiados pelas reflexões de Otávio Antunes: articular uma central de denúncias de fake news, pois não vamos conseguir combatê-las apenas de forma espontânea; promover formação para a “era digital” envolvendo a juventude e despertando para a criatividade; organizar o banco de dados da rede de contatos para um uso mais eficiente.
Estimulados pela reflexão de Márcio Pochmann: que os próximos mandatos se comprometam mais com o cooperativismo, com o associativismo e com a economia solidária; incentivar e reforçar mais o trabalho de educação de base; integrar melhor a subjetividade. E, seguindo a reflexão de Denilson Mariano, articular uma escola de fé e política no MOBON articulada com a proposta do CEFEP – Centro de formação fé e política da CNBB. Por fim, tendo presente a mesa de partilha da juventude: retomar o trabalho de articulação da juventude; intensificar a rede de trabalho de mulheres, favorecendo a “visibilidade negra”; mobilizar para a aprovação do projeto “Chame a Frida” uma iniciativa tecnológica de combate á violência doméstica que alcança a vítima onde ela estiver.
Por fim, foi destacado que o Encontro de Políticos Cristãos, formou-se a partir de uma base e referências católicas, em seguida, estendeu-se para a dimensão ecumênica integrando membros de outras igrejas e depois alargou-se ainda mais contando com a participação de pessoas de outras matrizes religiosas, tornando-se um Encontro de políticos cristãos em diálogo inter religioso. Na oração final, representantes das várias igrejas e de outras matrizes religiosas foram convidadas para a bênção final. Que o Sol Nascente continue a nos visitar e nos aponte por onde ir e como caminhar para concretizar um Brasil de mais vida, justiça e fraternidade para todos.
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